Fibrose Cística atinge 1 a cada 10 mil nascidos vivos no Brasil
Setembro Roxo busca conscientizar a população sobre a doença hereditária que afeta principalmente pulmões, pâncreas e intestino
Conhecida como Doença do Beijo Salgado ou Mucoviscidose, a Fibrose Cística é uma doença genética, que pode ser diagnosticada pelo Teste do Pezinho. Nesta quinta-feira (8) é a data em que em 1989, a descoberta do gene causador da fibrose cística, chamado de condutor transmembranar de fibrose cística (CFTR) foi publicada na Revista Science. Este trabalho foi um marco importante na área de pesquisa sobre a doença e por este motivo foi escolhido como o Dia Mundial da Fibrose Cística (FC), que atinge 1 a cada 10 mil nascidos vivos no Brasil.
Saiba mais sobre a enfermidade com a médica pneumologista pediatra, professora doutora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFG e supervisora do Programa de Residência em Pneumologia Pediátrica do HC-UFG/Ebserh, Lusmaia Damaceno Camargo Costa.
O que é fibrose cística?
A Fibrose Cística é uma doença genética, rara e ainda sem cura. Também chamada de Doença do Beijo Salgado ou Mucoviscidose devido ao fato de que o muco é viscoso, ou seja, as secreções do organismo são mais espessas do que o normal, dificultando a sua eliminação. Trata-se de uma doença de origem genética, transmitida de pais portadores para seus filhos. Não é uma doença contagiosa. Apesar de rara, no Brasil, a Fibrose Cística é uma das doenças raras mais comuns, atingindo 1 a cada 10 mil nascidos vivos no país. Em Goiás, atinge cerca de um a cada 18 mil nascidos vivos.
Com o desenvolvimento científico e a melhoria da assistência aos pacientes, a sobrevida vem aumentando a cada ano. Dados de registros internacionais apontam uma sobrevida média atual de cerca de 40 anos.
Qual o principal fator de risco para fibrose cística?
Por se tratar de uma doença genética recessiva, a pessoa já nasce com ela, precisando, para isso, herdar um gene defeituoso do pai e um da mãe, obrigatoriamente, para ter a doença.
Como a doença pode ser identificada?
A doença pode ser identificada a partir da suspeita clínica, pelos sinais de alarme, ou pelo Teste do Pezinho, ou ainda por ter um parente que tem a doença. A partir da suspeita, é solicitado o Teste do Suor, que realiza o diagnóstico da doença, além do teste genético, que confirma e especifica qual o tipo de defeito genético (mutação) que a pessoa apresenta. Ressalto que o Teste do Pezinho ou Teste de Triagem Neonatal é aquele obrigatório para todos os recém-nascidos, em que uma gota de sangue é retirada e enviada ao laboratório para o diagnóstico de algumas doenças. Quanto mais cedo se detectar a doença e iniciar o tratamento, melhor será a qualidade de vida.
Todos os médicos devem ficar atentos aos sinais e sintomas de alerta para a suspeita de Fibrose Cística, em especial os médicos pneumologistas (tosse crônica, bronquiectasias), otorrinolaringologistas (sinusites recorrentes, polipose nasal), gastroenterologistas (diarreia crônica, pancreatite recorrente, insuficiência pancreática) e urologistas (infertilidade masculina).
O HC-UFG é um Centro de Referência para o tratamento desses pacientes, contando com um ambulatório multidisciplinar para o atendimento de crianças, além de um ambulatório específico para o atendimento dos adultos. Atualmente, cerca de 40 crianças e 20 adultos são acompanhados nos ambulatórios de fibrose cística (pediátrico e de adultos) do HC. O atendimento no HC é feito às terças pela manhã, sendo as crianças atendidas no ambulatório B e os adultos atendidos no ambulatório C.
Há maneiras de prevenir a fibrose cística?
Não há maneiras de prevenir a doença, mas o diagnóstico precoce e o seguimento adequado, com as terapias medicamentosas (medicamentos orais e inalatórios) e não medicamentosas (fisioterapia respiratória, atividade física, nutrição adequada, higiene mental), além da detecção precoce e abordagem das complicações podem fazer toda a diferença, promovendo uma maior sobrevida com qualidade.
Quais as complicações mais comuns provocadas pela doença?
As complicações mais frequentes incluem a piora acelerada da capacidade respiratória, o que pode levar à necessidade de transplante pulmonar. A desnutrição também é uma condição comum, que precisa de uma abordagem intensiva. Outras complicações incluem:
— Diabetes relacionado à fibrose cística;
— Hipoxemia, que é a baixa concentração de oxigênio no sangue e Hipertensão Pulmonar, que é o aumento da pressão nos vasos sanguíneos dos pulmões;
— Polipose nasossinusal;
— Pneumotórax (ruptura dos alvéolos com saída de ar) e hemoptise (escarro com sangue);
— Exacerbação Pulmonar, que é o agravamento dos sintomas respiratórios, e Insuficiência Respiratória Aguda;
— Doença Hepática;
— Obstrução Intestinal;
— Infertilidade.
A infertilidade faz com que a pessoa com fibrose cística tenha muita dificuldade em ter filhos, especialmente no caso dos homens. Além disso, uma em cada quatro gestações de pais portadores do gene poderá gerar uma criança doente. Por isso, é sempre feito um aconselhamento genético antes do paciente procurar tratamento para ter filhos.
Como deve ser feito o acompanhamento de uma pessoa diagnosticada com a doença?
O acompanhamento de pessoas que recebem o diagnóstico deve ser feito em Centros de Referência para o tratamento da doença, como o HC-UFG. As consultas são feitas por vários profissionais simultaneamente, com discussão do caso para a construção de um Plano de Tratamento. Fazem parte dessa equipe: médicos (pediatra, pneumologista, gastroenterologista, otorrinolaringologista); nutricionista; fisioterapeuta; psicólogo; assistente social e enfermeiro.
Grande parte do tratamento é feito pelos cuidados que os pacientes e os familiares devem ter em casa, tais como:
– Assegurar uma boa alimentação com a ingestão correta dos medicamentos (enzimas pancreáticas) antes de cada refeição;
– Realizar as inalações que promoverão uma eliminação do muco e melhora da oxigenação;
– Praticar atividades físicas e manobras de fisioterapia pelo menos duas vezes ao dia;
– Utilizar os antibióticos e todos os medicamentos prescritos pelo médico;
– Ter momentos de lazer e práticas de atividades prazerosas para manter uma boa saúde mental.
A maioria dos exames é realizada pelo SUS, incluindo o Teste do Pezinho e os exames para o acompanhamento. Já o Teste do Suor é realizado pelo SUS, sem custo para crianças com idade até dois anos de idade, na APAE de Anápolis. Acima dessa idade, o exame é feito no mesmo local, porém não custeado pelo SUS.
Quanto às medicações, as principais são disponibilizadas pelo SUS, via Central de Medicamento de Alto Custo. Porém, algumas também muito importantes para o tratamento ainda não foram ainda incorporadas no Protocolo de Diretrizes Terapêuticas.
Considerações finais
Temos muito o que comemorar quanto aos avanços no tratamento da Fibrose Cística. Hoje os pacientes vivem muito mais e muito melhor. Porém, muito há ainda por ser feito. Novas perspectivas incluem o tratamento com novos fármacos que corrigem o defeito genético, chamados corretores ou potencializadores do CFTR, cujo custo ainda é muito alto. E ainda temos o desafio de acesso a alguns medicamentos ainda não incorporados no SUS e o desafio da adesão ao tratamento, por se tratar de doença crônica onde o paciente tem que incorporar o tratamento à sua rotina de vida.
É muito importante que os pacientes compartilhem suas ansiedades, necessidades e conquistas uns com os outros. Para isso, ressalto a importância das associações de pacientes. Em Goiás, temos a Associação Goiana de Fibrose Cística (AGAFIBRO), que desempenha um belo trabalho junto aos pacientes e à equipe interprofissional.
Alô Valparaíso/* Com as informações do HC-UFG/ Foto: Reprodução-portal gov.br