Novas regras do vale-refeição e do vale-alimentação mudam o mercado de benefícios
Decreto estabelece teto de taxas, reduz prazo de repasse e obriga interoperabilidade entre maquininhas
As regras do vale-refeição e do vale-alimentação mudaram no País. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou em novembro o Decreto Nº 12.712/2025, que moderniza o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), redefine o funcionamento desse mercado e promete alterar a relação entre restaurantes, trabalhadores e operadoras de benefícios. Entre as principais mudanças estão o teto de 3,6% para as taxas cobradas dos estabelecimentos, a redução no prazo de repasse dos valores para até 15 dias e a obrigatoriedade de que qualquer maquininha aceite todas as bandeiras. As novas regras entraram em vigor no dia 12 de novembro, no entanto, diferentes aspectos têm cronogramas específicos: 90 dias para adequação de prazos e taxas, 180 dias para abertura dos “arranjos” (sistemas internos das operadoras que processam o pagamento) e 360 dias para interoperabilidade completa, quando qualquer cartão poderá ser usado em qualquer maquininha, independentemente da bandeira.

O economista Luciano Nakabashi, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, diz que a interoperabilidade deve aumentar a concorrência entre as empresas do setor. “Você elimina uma barreira operacional. Hoje algumas empresas têm convênios específicos e apenas certos restaurantes conseguem oferecer o serviço. Quando qualquer maquininha passa a aceitar todas as operadoras, todas as empresas que oferecem esse tipo de serviço entram na disputa. Isso reduz uma barreira de utilização e, consequentemente, amplia a concorrência.”
Antes do decreto que fixou o teto de 3,6% para a taxa cobrada dos estabelecimentos que aceitam vale-refeição, não havia um limite definido em lei. As tarifas eram negociadas livremente e variavam conforme o mercado. Segundo o professor, “em média, esse repasse era superior aos 3,6%”. Por isso, ele acredita que a medida tende a reduzir a receita das empresas de benefícios. “Vai deixá-las numa situação mais difícil, porque, além de diminuir o repasse, você aumenta a concorrência. Esses dois fatores fazem com que as empresas tenham que se movimentar mais para se manter no mercado”, explica. “A sobrevivência delas vai depender muito de adaptações, de tomarem medidas para manter sua base de clientes e sua participação no mercado. Elas vão receber menos por transação, então terão que tentar compensar isso atendendo a um volume maior de clientes, já que o repasse por serviço prestado será mais baixo”, conclui.
Efeitos
O professor também analisa os efeitos da mudança no prazo de repasse, reduzido de 30 para 15 dias. “Essas operadoras ganham ao reter os valores por mais tempo, porque podem aplicar o dinheiro enquanto não repassam ou usar esses recursos no caixa, reduzindo a necessidade de capital próprio. Com o prazo menor, elas perdem esse benefício, o que torna a operação mais difícil para quem oferece esse tipo de serviço.” Por outro lado, o especialista afirma que a mudança pode ser positiva para as empresas que recebem os pagamentos, geralmente micros e pequenos negócios, como restaurantes e bares. “Elas vão receber o dinheiro mais rapidamente e com menor taxa de repasse. Muitas têm dificuldade de manter capital de giro para pagar fornecedores, salários ou comprar matéria-prima. Com o repasse mais rápido, dependem menos de crédito de terceiros, o que facilita a operação.”
Segundo Nakabashi, o efeito mais evidente para o consumidor é a maior facilidade de uso do cartão em diferentes estabelecimentos. “Você recebe parte do salário em vale-refeição ou vale-alimentação e, muitas vezes, fica limitado aos lugares onde pode usar. Isso restringe bastante”, explica. “Ampliando as opções de uso, a experiência melhora: a pessoa passa a ter mais liberdade para decidir onde utilizar o benefício. Além disso, ao longo do tempo, a redução de custos para bares, restaurantes e outras empresas que aceitam esses vales também pode impactar o consumidor. É uma diminuição de despesa para esses estabelecimentos, o que, marginalmente, pode até resultar numa redução do preço do serviço ou do produto que eles oferecem”, conclui.
Por fim, o economista avalia que as novas regras enfrentam problemas estruturais do mercado de benefícios e podem aumentar a eficiência do sistema. “São avanços importantes para melhorar a concorrência e facilitar a vida das empresas, dos bares e dos restaurantes que aceitam o vale-refeição. Em geral, esses estabelecimentos são pequenos ou médios negócios, enquanto as operadoras de cartão são empresas muito maiores. Então, você reduz um pouco o poder de mercado dessas operadoras e, ao mesmo tempo, torna o uso do cartão mais simples para quem aceita e para quem utiliza o benefício.” Ele ressalta que, se existem lacunas, não são grandes problemas. “Se aparecer alguma questão mais relevante, deve ficar clara com o tempo. Mas, no geral, a regulamentação ataca os principais pontos de forma bem-estruturada e segue na direção correta.”

Alô Valparaíso/* Com as informações do Jornal da USP | Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil


